quarta-feira, 9 de setembro de 2009

PRESÍDIOS BRASILEIROS - UNIVERSIDADES DE CRIMES


Não é de hoje que, no Brasil, combate-se o crime por meio de práticas de igual calibre. E os delitos não cessam com a detenção dos infratores. As prisões e o tratamento dispensado aos detidos são de tal forma degradantes e desumanos que, em vez de recuperá-los para o convívio social — objetivo declarado das casas de correção do Estado —, os tornam ainda mais ferozes e pervertidos.

Não há triagens nas penitenciárias, o que submete detidos por delitos leves ao convívio com criminosos ferozes, transformando os presídios, sucursais do inferno, em verdadeiras universidades do crime. Sai-se de lá, em regra, bem pior do que se entrou.
Ilude-se quem supõe que é possível reduzir a criminalidade e construir-se a paz social mantendo-se depósitos de gado humano em penitenciárias. A violência, onde estiver sendo praticada, irradia-se por toda a sociedade que a patrocina.



Já no traçado arquitetônico dos presídios, com seus cubículos imundos, maus tratos físicos e morais, constata-se o desprezo pela condição humana. Percebe-se que não se teve em mente algo essencial e elementar: que o infrator, por maior que tenha sido o seu delito, é um ser humano — e, como tal, precisa ser tratado.


O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio, Wadih Damous, afirmou nesta quinta-feira que o relatório da ONU que aponta casos de tortura nos presídios brasileiros é correto.
- A ocorrência de maus tratos e torturas aos presos, além das condições subhumanas dos presídios brasileiros e a omissão das autoridades governamentais diante deles são fatos que até as pedras sabem. E são fatos antigos - afirmou.
Para ele, o pior de toda essa situação é que parte da sociedade apóia esta tortura contra os presos, o que, em sua opinião, ameaça os princípios básicos da civilização humana:
- O que mais nos preocupa é que a omissão dos governos é "legitimada" pela opinião de parcelas significativas da população que admitem, como vingança, esse tipo de tratamento aos presos.

Na década dos 30 do século passado, o advogado Sobral Pinto invocou a Lei de Proteção dos Animais — nada menos! — para defender o líder comunista Luiz Carlos Prestes, preso em 1935, após mal-sucedida tentativa de insurreição política.
Sobral, católico e antípoda ideológico de Prestes, encontrou-o num vão de escada, sem espaço físico para caminhar, sem direito a banhos de sol, sem acesso a livros ou a qualquer outra forma de atividade. Nem um animal sobreviveria muito tempo a tal ambiente. A denúncia obrigou o governo a oferecer a Prestes condições menos inóspitas — embora ainda bem longe da ideal.
Isso, claro, em face da notoriedade que a denúncia obteve. Os que não têm tal privilégio apodrecem como carne em açougue.



De lá para cá, passados 74 anos, o que mudou. Nada. A OAB acaba de ser informada de nova abjeção nessa matéria, mostrando a inesgotável e sórdida imaginação criadora dos violadores dos direitos humanos. Trata-se das prisões-contêineres - caixas de estrutura metálica, sem janelas e sem ventilação, absolutamente inadequadas ao fim a que se destinam: abrigar o ser humano.
Em diversos estados da federação — entre outros, Espírito Santo, Pará e Santa Catarina, onde já foram denunciadas —, os presos são encaminhados a esses depósitos, em condições as mais abjetas, degradantes até mesmo para animais.
A simples existência de tais prisões já configura em si um delito hediondo, inominável, por parte do Estado, que tem o dever de zelar pela integridade e dignidade dos que mantém sob sua guarda.
Equipara-se a crime de tortura, de lesa-humanidade, que o Conselho Federal da OAB, perplexo e indignado, denuncia ao Governo Federal e à sociedade brasileira, na expectativa de que o corrija imediatamente e enquadre, nas penas da lei, de maneira exemplar, os responsáveis por sua implantação.

A OAB, nesses termos, encaminhou também essa denúncia aos fóruns internacionais competentes: Anistia Internacional, Organização das Nações Unidas e Corte Interamericana de Direitos Humanos, de San José da Costa Rica. Trata-se de escândalo insuportável, que merece o mais veemente repúdio da sociedade brasileira.
O Brasil não resolverá o desafio da violência enquanto continuar a tratar os seus infratores — face mais dramática da crise social —como animais. Ou por outra, pior que os animais. Basta comparar o padrão vigente nos zoológicos com o das penitenciárias.

Por César Britto

Um comentário:

  1. Melka Germana-Aluna da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará.8 de março de 2010 às 23:46

    Estamos na luta por melhoras!
    Conte conosco!

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